A revolução da NBR 16970 e por que ela importa
O Steel Frame deixou de ser 'sistema inovador' e agora é oficialmente convencional no Brasil — e isso muda tudo para quem quer construir ou comprar. Com a publicação da NBR 16970 em maio de 2022, o Light Steel Framing ganhou respaldo normativo completo, facilitando aprovações, financiamentos e consolidando sua posição como alternativa moderna à alvenaria tradicional. Este artigo apresenta o panorama completo das certificações e normas que regem esse sistema construtivo, oferecendo orientação prática tanto para profissionais quanto para consumidores que buscam qualidade e segurança.
O mercado brasileiro de Steel Frame cresceu 60% nos últimos cinco anos segundo a ABCEM, e a produção de perfis galvanizados saltou 27,7% apenas em 2023. Esse crescimento acelerado torna essencial compreender as regras do jogo: quais normas técnicas devem ser seguidas, como funcionam os financiamentos da Caixa e quais certificações agregam valor real ao seu projeto.
Principais Indicadores
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%Crescimento 5 anos
mercado LSF Brasil
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%Produção perfis 2023
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Casas/ano EUA
sistema LSF
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+Projetos LEED Brasil
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Projetos AQUA-HQE
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%Economia energética
LEED certificado
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MPaResistência ao escoamento
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+Anos vida útil
Especificações técnicas que fazem diferença
Os perfis de aço para Steel Frame seguem requisitos rígidos definidos pela NBR 15253:2014. O aço estrutural deve apresentar resistência ao escoamento mínima de 230 MPa (qualidade ZAR230) e relação entre limite de resistência e escoamento de pelo menos 1,08. A espessura nominal varia de 0,80mm a 2,30mm para elementos estruturais — bem diferente dos 0,50mm usados em divisórias de drywall.
A proteção contra corrosão merece atenção especial. Para ambientes não marinhos, exige-se revestimento de zinco Z180 (180g/m²). Em regiões litorâneas ou com atmosfera salina, o mínimo sobe para Z275 (275g/m²). Construtoras mais criteriosas especificam Z350 para casas a menos de dois quilômetros do mar — uma decisão que pode estender a vida útil da estrutura por décadas.
PBQP-H e SiNAT: as siglas que abrem portas
O Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H) funciona como selo de qualidade para o setor da construção civil desde 1998. Para empresas de Steel Frame, a certificação no SiAC (Sistema de Avaliação da Conformidade) é praticamente obrigatória: sem ela, construtoras ficam impedidas de participar do Minha Casa Minha Vida e de acessar linhas de financiamento preferenciais.
O programa opera em dois níveis. O Nível A exige controle de 100% dos serviços e materiais, com pelo menos metade dos processos documentados. O Nível B é mais flexível, cobrindo 40% dos serviços e 50% dos materiais, funcionando como degrau intermediário para empresas em processo de qualificação.
Já o SiNAT (Sistema Nacional de Avaliações Técnicas) avalia sistemas construtivos que não possuem norma ABNT específica. Para Steel Frame, a referência era a Diretriz SINAT nº 003, que permitia emissão de DATec (Documento de Avaliação Técnica). Com a NBR 16970, o DATec deixou de ser obrigatório, mas empresas que o possuem ainda têm vantagem competitiva — LP Brasil e Plasbil (Grupo Saint-Gobain) são exemplos de detentoras desse documento.
Financiamento da Caixa: como funciona na prática
A Caixa Econômica Federal financia construções em Steel Frame em condições equivalentes às de alvenaria tradicional. Os valores podem chegar a 100% da obra quando o terreno é próprio ou até 80% em operações de compra de terreno com construção. Os prazos se estendem por até 30 anos, com possibilidade de uso do FGTS.
O processo segue etapas padronizadas: simulação, análise de crédito, assinatura de contrato, análise do terreno, registro em cartório, acompanhamento da obra e entrega final. A diferença está na exigência de projeto arquitetônico e estrutural específico para Light Steel Framing, que deve passar pela Gerência de Desenvolvimento Urbano da Caixa.
A liberação de recursos acontece conforme o cronograma físico-financeiro. Um engenheiro terceirizado realiza vistorias periódicas para atestar o andamento da obra — sistema idêntico ao aplicado em construções convencionais.
Brasil versus mundo: como nossas normas se comparam
O Light Steel Framing nasceu nos Estados Unidos na década de 1850 e ganhou impulso após a Segunda Guerra Mundial. Hoje, mais de 500.000 casas por ano são construídas com esse sistema nos EUA. No Japão, após o terremoto de Kobe em 1995, o Steel Frame foi legislado como sistema estrutural, e o país produz cerca de 200.000 edificações anuais nessa tecnologia.
As normas americanas são referência global. O AISI (American Iron and Steel Institute) publica especificações abrangentes como a S100-16 para dimensionamento, S230-19 para residências de até três pavimentos e S400-20 para projeto sísmico. Já os padrões ASTM definem requisitos de materiais — o C955 especifica perfis estruturais com espessura mínima de 0,836mm, muito próximo dos 0,80mm brasileiros.
Na Europa, o Eurocode 3 (EN 1993-1-3) governa estruturas de aço conformado a frio. O Reino Unido lançou em outubro de 2024 a National Light Gauge Steelwork Specification, consolidando requisitos de fabricação e instalação com vigência a partir de abril de 2025.
As normas brasileiras alinham-se bem aos padrões internacionais, especialmente em metodologia de projeto e requisitos de proteção contra corrosão. A principal lacuna está em normas prescritivas simplificadas para residências térreas, área em que o AISI S230 americano oferece caminho direto para projetos mais simples.
Certificações ambientais: LEED, AQUA-HQE e Selo Casa Azul
Construir em Steel Frame facilita a obtenção de certificações de sustentabilidade. O aço é 100% reciclável sem perder propriedades mecânicas, a construção a seco reduz drasticamente o consumo de água, e as cavidades entre perfis permitem isolamento térmico eficiente.
O Brasil ocupa a 4ª posição mundial em edificações certificadas LEED, com mais de 641 projetos concluídos e 1.500 em andamento. O sistema de pontuação beneficia o Steel Frame em categorias como Materiais e Recursos (conteúdo reciclado, redução de resíduos) e Energia e Atmosfera (eficiência térmica). Edificações certificadas apresentam, em média, 25% menos consumo energético.
A certificação francesa HQE foi tropicalizada pela Fundação Carlos Alberto Vanzolini em parceria com a Escola Politécnica da USP. São 378 projetos certificados no país, totalizando mais de 14 milhões de m² construídos. O Steel Frame contribui fortemente nas categorias de escolha de produtos e processos construtivos, canteiro de obras de baixo impacto e conforto higrotérmico e acústico.
Criado pela Caixa em 2009 e reformulado em 2020, o Selo Casa Azul oferece vantagem concreta: redução de 0,25% a 1% nas taxas de juros do financiamento SBPE. Edificações com certificações ambientais apresentam valorização de 10% a 20% no mercado imobiliário e redução de 40% a 60% no consumo de água durante a operação.
Na prática: o que profissionais precisam verificar
Para engenheiros e construtores, a conformidade normativa começa na especificação de materiais. Perfis estruturais devem ter espessura mínima de 0,80mm (o padrão usual é 0,95mm), galvanização Z-275 e resistência ao escoamento de 230 MPa. Parafusos externos precisam ser de aço inoxidável ou com tratamento anticorrosivo.
A documentação obrigatória inclui: ART (Anotação de Responsabilidade Técnica) para engenheiros ou RRT para arquitetos; Projeto estrutural compatível com NBR 16970-2; Memorial descritivo com especificações de todos os materiais; Projetos complementares (hidráulico, elétrico, PPCI); Comprovação de atendimento à NBR 15575 (desempenho).
O desempenho térmico segue a NBR 15575, que exige atendimento a transmitância térmica e capacidade térmica conforme a zona bioclimática. Já o desempenho acústico opera em três níveis (Mínimo, Intermediário e Superior), sendo o primeiro obrigatório. Paredes de Steel Frame com montantes de 90mm, drywall e lã de vidro atingem desempenho igual ou superior à alvenaria convencional.
Para resistência ao fogo, o TRRF (Tempo Requerido de Resistência ao Fogo) varia de 30 a 120 minutos conforme ocupação e altura da edificação. O aço perde 40% da resistência acima de 550°C, exigindo proteção passiva com placas de gesso tipo X ou argamassas projetadas. Por outro lado, perfis de aço são incombustíveis — não propagam chamas.
O que compradores devem exigir antes de fechar negócio
Consumidores que optam por Steel Frame precisam adotar postura ativa na verificação de qualidade. Antes de contratar, confirme se a construtora possui CNPJ ativo, experiência comprovada no sistema e registro no CREA/CAU do responsável técnico. Solicite referências de obras anteriores e, se possível, visite-as.
O contrato deve especificar claramente os materiais utilizados, incluindo espessura dos perfis e classe de galvanização. Exija cronograma físico-financeiro detalhado, memorial descritivo completo e cópia da ART/RRT. Na entrega, solicite Manual do Proprietário (conforme NBR 14037), habite-se, termo de garantia e projetos 'as-built'.
Sinais positivos incluem perfis com certificação e rastreabilidade (código de lote visível), galvanização Z-275 ou superior claramente especificada, membrana hidrófuga corretamente instalada e isolamento termoacústico nas paredes externas e internas. Contraventamentos e reforços estruturais devem estar posicionados conforme projeto.
Sinais de alerta: perfis sem identificação, orçamento muito abaixo do mercado, recusa em fornecer documentação técnica, ausência de memorial descritivo ou profissional responsável não registrado em conselho de classe.
A garantia legal para solidez e segurança da construção é de cinco anos conforme Código Civil (artigo 618). Fabricantes de perfis costumam oferecer garantia de 20 anos para a estrutura metálica. A vida útil esperada de edificações em Steel Frame supera 50 anos com manutenção adequada — verificação anual de juntas, limpeza de calhas e inspeção de infiltrações.
Capacitação e onde buscar conhecimento
O mercado oferece diversas opções de treinamento. O CBCA (Centro Brasileiro da Construção em Aço) disponibiliza curso online gratuito de Light Steel Framing em cinco módulos ao longo de oito semanas. A Espaço Smart em parceria com o SENAI oferece curso presencial de 30 horas. Para certificação universitária, o curso Mestre Steel Frame possui reconhecimento do MEC.
Entidades como ABCEM (Associação Brasileira da Construção Metálica) e Instituto Aço Brasil publicam regularmente manuais técnicos, dados de mercado e promovem eventos setoriais. O CBCA disponibiliza gratuitamente o manual 'Steel Framing – Requisitos e condições mínimos para financiamento pela CAIXA', referência essencial para profissionais.
Perspectivas e tendências do mercado brasileiro
O Steel Frame representa hoje cerca de 3% do mercado residencial brasileiro, com forte concentração em São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Empresas como Innova Steel (maior grupo verticalizado do segmento, com mais de 570.000 m² construídos) e Espaço Smart (maior indústria de steel framing da América Latina, capacidade de 40.000 toneladas/ano) lideram a expansão.
A integração com BIM cresceu 45% em 2024, permitindo modelagem completa em 3D com precisão milimétrica. Sistemas modulares pré-fabricados ganham espaço, reduzindo ainda mais o tempo de obra. A adoção pelo programa Minha Casa Minha Vida representa oportunidade significativa de escala.
O principal desafio permanece cultural. A preferência brasileira por 'casa de tijolo' ainda resiste, mesmo diante de vantagens objetivas: construção até 50% mais rápida, redução de 90% no consumo de água na obra, previsibilidade de custos e canteiro mais limpo. À medida que mais edificações demonstram durabilidade e desempenho ao longo do tempo, a tendência é de aceleração na adoção.
Conclusão: construindo o futuro com conhecimento
O Steel Frame no Brasil atingiu maturidade normativa com a NBR 16970, equiparando-se legalmente à alvenaria tradicional. As certificações PBQP-H e ambientais (LEED, AQUA-HQE, Selo Casa Azul) agregam valor mensurável — seja em facilidade de financiamento, economia operacional ou valorização imobiliária.
Para profissionais, dominar esse arcabouço técnico tornou-se diferencial competitivo. Para consumidores, compreender as normas permite exigir qualidade com argumentos sólidos. Em ambos os casos, o conhecimento é a melhor proteção.
Se você está planejando construir ou comprar em Steel Frame, comece exigindo documentação completa, verificando especificações de materiais e confirmando certificações. O sistema construtivo evoluiu — agora é hora de elevar também o padrão de exigência do mercado.